• Dom Filipe - Abade do Mosteiro do Rio de Janeiro

    DA SEXTA-FEIRA SANTA DA PAIXÃO DO SENHOR


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    HOMILIA PARA A SOLENE AÇÃO LITÚRGICA

    DA SEXTA-FEIRA SANTA DA PAIXÃO DO SENHOR


     (Is 52,13 – 53,12; Hb 4,14-16;5,7-9; Jo 18,1 – 19,42).


    Quando eu for elevado atrairei todos a mim

    Do seu lado direito brotaram água e sangue


    Introdução
    §  Caros irmãos, prezados fiéis. Ontem, às 17:00 h, com a Missa da Ceia do Senhor, a Igreja iniciou as celebrações do Tríduo Sacro da Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus Cristo, Redentor dos homens.
    §  Hoje, Sexta-feira Santa, reunimo-nos para a celebração da Paixão e Morte do Senhor Jesus, através desta Solene Ação Litúrgica, exatamente às 15:00 h, hora em que provavelmente Jesus foi crucificado.

    1.    A Solene Ação Litúrgica
    §  A celebração é envolvida em grande silêncio. Justamente em silêncio os celebrantes se aproximaram do altar e prostraram-se: silêncio e prostração que ilustram a morte de Jesus. Sim, diante do enigma da morte, sobretudo da morte do Filho de Deus, não se pode falar muito! Precisa-se de silêncio para contemplá-la, numa tentativa quase inútil de compreendê-la, morte antecedida de tanta rejeição, injúria e sofrimento.
    §  A celebração comporta três partes: 1) a Liturgia da Palavra; 2) a Adoração a Santa Cruz; e 3) a Santa Comunhão (hoje não se celebra a Santa Missa, mas receberemos a Sagrada Comunhão, ontem depositada no sacrário).

    2.    O Mistério celebrado
    §  A liturgia de hoje celebra o mistério da cruz vivido por Jesus: nela Ele experimentou sofrimento e grande humilhação. Contudo, humilhação e sofrimento, que resultaram na Sua glorificação quando ressuscitou. Hoje de certo modo já é Páscoa. Por quê?
    §  Páscoa é passagem. Na história bíblica é passagem da escravidão à liberdade; da morte à vida! Jesus, morrendo hoje fez sua passagem deste mundo ao Pai, da morte à ressurreição. Sua ressurreição significa vida transfigurada, vida plena, vida, vida gloriosa – de agora em diante está sentado à direita do Pai (Credo).
    §  É páscoa também para nós, pois do lado do seu corpo pendente na cruz, brotaram água e sangue. A tradição viu nesses dois elementos que saíram do seu corpo ainda na cruz, a vida sacramental da Igreja: a água (Batismo); o sangue (Eucaristia).
    §  Sim, a Igreja vive dos Sacramentos! É por meio dos Sacramentos que ela nos comunica a graça de Deus, para acompanhar-nos desde o nascimento (batismo) até a morte (a unção dos enfermos). E que extraordinária sabedoria de Deus: Ele nos comunica Sua vida divina através dos sacramentos, para que possamos também fazer gradativamente nossa passagem da morte à vida, da escravidão de qualquer situação à liberdade; passagem da vida natural à vida sobrenatural (em Deus).

    3.    A Liturgia da Palavra
    3.1. A Primeira Leitura (Is)
    §  Tirada de Isaías, apresenta o Servo sofredor, figura profética em quem a tradição reconheceu a pessoa de Cristo, o homem das dores. Sim, tudo o que Ele viveria cerca de seis séculos depois está aí: rejeição, humilhação, dor, sua morte expiatória, sua glorificação!
    §  O poema prevê a Paixão e mostra a razão de tanta dor; ao mesmo tempo, sinaliza a vitória final de Jesus: Ele foi transpassado... Pelos seus sofrimentos meu servo justificará as multidões, carregará sobre si os pecados do povo. Meu servo terá êxito, subirá, elevar-se-á a sublime altura. Pelos seus sofrimentos, ele verá a luz e será cumulado.
    3.2. O Evangelho (Paixão segundo São João)
    §  Apresenta detalhes não assinalados pelos outros evangelhos. Em São João, Cristo, não os seus perseguidores, é quem assume o controle de tudo. Só ele diz que as pernas de Jesus não foram quebradas, fazendo coincidir uma exigência da Lei sobre os preparativos da Páscoa antiga, que dizia, não quebrareis osso algum (Ex 12,26).
    §  Mostra Jesus seguindo livremente para a morte com plena consciência do que acontece. Ele não abranda os sofrimentos de Cristo. No entanto, uma atmosfera de serenidade e paz acompanha seus passos que revelam sua profunda consciência de que morre para salvar.
    §  Em São João, Jesus morre no momento em que, no templo, eram imolados os cordeiros destinados à celebração da Páscoa (19,31). Isto porque a imolação de Jesus foi um verdadeiro sacrifício e realizado uma vez por todas, pois a vítima foi o Cordeiro de Deus, Ele que veio tirar os pecados do mundo.
    §  Outro registro de São João é o da cruz: esta tem lugar central na narrativa. Em São João a cruz é como que um trono para Jesus. Sua subida à cruz é descrita como exaltação, significa sua glorificação. Apenas São João diz que Jesus carregou a cruz. A cruz, para ele, é o verdadeiro e definitivo sacrifício pascal (19,36), e ao redor da mesma, Jesus reúne seu povo, o povo da nova aliança: Quando eu for elevado da terra, atrairei todos a mim (Jo 12,32).
    §  Foi apenas São João que registrou outro momento especial aos pés da cruz: Maria, dada como mãe ao discípulo amado, oferecida por extensão como mãe a todos os homens simbolizados na pessoa do discípulo: Eis tua mãe! Especial doação: Jesus agoniza oferecendo sua mãe como mãe de toda a humanidade. Ninguém melhor do que Maria para ensinar-nos a ficar aos pés da cruz, a tirar da cruz força para as labutas de cada dia.

    4.    Reflexão / Mensagem
    §  Meus irmãos e fiéis, a liturgia deste dia sugere dois olhares: um olhar para a cruz, sinal e instrumento da nossa salvação; outro, para a morte, fonte de novo nascimento.
    §  Na cruz, Jesus Cristo ofereceu ao Pai o seu sacrifício, entregou-se por nós. De modo muito simples, não menos profundo, ela, a cruz, e as graças de que é portadora, ela chegou a cada um de nós. No dia do nosso batizado, após ser dado a conhecer o nosso nome, o sacerdote traçou o sinal da cruz na nossa fronte – a partir deste dia ficamos marcados para sempre pela cruz de Cristo, como sinal de vitória e salvação.
    §  Desde que Jesus nela foi suspenso, a cruz tornou-se motivo de glória, centro de atração para todos os homens. Espalhou-se nos 4 cantos do mundo – igrejas, casas, hospitais, escolas, sobre os túmulos – para também espalhar esperança e paz. E hoje, do alto da cruz, erguido perante o mundo e a história, Jesus continua chamando todos os homens de qualquer tempo ou lugar: seus braços continuam abertos convidando-os a contemplar Seu infinito amor.
    §  Meditemos sobre a morte. Quem é essa dama que nem poupou o filho de Deus? Morte que contradiz a sede de vida que há em cada coração. Morte que desfaz planos, frustra sonhos, interrompe amizades, estabelece separação, deixa saudade! Para o nosso tempo que procura sucesso, acúmulo e aceitação, a morte representa o fim de tudo, realidade pouco aceitável.
    §  Entretanto, a morte de Jesus trouxe sentido à morte cristã: Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, ainda que morra, viverá. Quem vê o Filho e n’Ele crê tenha a vida eterna, e eu o ressuscitarei no último dia (Jo 11,25; 6,40). Com sua ressurreição após a morte Jesus inaugurou o caminho da nossa ressurreição futura. Por isso que a morte é fonte de vida. Quem morre nasce para o grande encontro e o paraíso, nasce para a vida sem fim!
    §  Faremos, após esta homilia, a Oração Universal. São universais porque inclui todas as categorias de pessoas. Rezaremos pela: 1) a Igreja; 2) o Papa; 3) todas as categorias de fiéis; 4) os catecúmenos; 5) a unidade dos cristãos; 6) os judeus; 7) os que não creem no Cristo; 8) os que não creem em Deus; 9) pelos poderes públicos; 11) os que sofrem provações.
    §  Nesta oração, proclamada apenas no dia de hoje, ninguém fica excluído – rezaremos até pelos que não creem – isto porque estamos reunidos diante de Cristo crucificado, justamente no dia em que do alto da cruz Ele revelou Seu infinito amor por TODOS os homens.

    Conclusão
    §  Concluamos com Santo Anselmo, num texto sobre a cruz, texto que merece ser lido e meditado: Ó meu rei, os cravos te atravessam e tu prometes o paraíso! O que teus milagres não puderam fazer, a tua cruz fez. O bom ladrão te reconheceu com maior certeza sobre a cruz, do que na pregação e nos milagres. Ó poder da cruz, que dissipas as dúvidas, ó triunfo do crucificado! Ó desejo das almas, onde é o Paraíso? Será que o Paraíso está contigo? Felizes os que estão contigo no Paraíso, pela fé e pelo amor!
    (Or 43:PL 158,939-941).
    §  Que a cruz gloriosa do Senhor seja para nós penhor de esperança, de salvação e de paz!

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