HOMILIA
PARA O I DOMINGO DA QUARESMA - B
Gn 9,8-15; 1Pd 3,18-22; Mc
1,12-15
Ele vivia entre os
animais selvagens, e os anjos o serviam
Introdução
§ Prezados irmãos e fiéis. A Igreja, na última quarta-feira (de Cinzas), iniciou o
Tempo da Santa Quaresma – 40 dias que vão de hoje até ao sábado santo – com o
convite convertei-vos e
crede no evangelho. Hoje, neste I
Domingo, ela retoma este mesmo convite a partir do evangelho que acabamos de
ouvir.
1. A Quaresma
§ A liturgia da Quaresma se
reveste de certa sobriedade a partir de alguns sinais percebidos desde a última
quarta-feira: o paramento de cor roxa
(cor de penitência), a ausência do ‘Glória’, como também certa austeridade nas
leituras bíblicas.
§ Desde o século IV que a Igreja instituiu este tempo de
graça e de conversão. Era,
inicialmente, o período durante o qual os catecúmenos
(adultos que estavam abraçando a fé
cristã), se preparavam para receber o Santo Batismo na noite da Páscoa.
§ Hoje, para nós, 40 dias que
nos preparam para celebrarmos dignamente a Paixão, Morte e Ressurreição do
Messias Salvador – acontecimento único na História das Religiões, evento
central no Cristianismo e na nossa Igreja e decisivo para a salvação dos
homens: Jesus,
que parecia ter morrido, ressuscitou para permanecer/ficar no meio de nós.
§ Este mistério da
ressurreição de Jesus, atualizado a cada ano pela Igreja para renovar a vida
nova que Ele veio trazer-nos, merece um Tempo especial de preparação, justamente a
Santa Quaresma. Cada
quaresma, assim, prepara o cristão para entrar neste mistério da bondade de
Deus – que enviou-nos seu Filho redentor – e com Ele ressuscitar também para
uma vida nova.
2. A Liturgia da Palavra
§ As leituras que acabamos de ouvir falam de uma
humanidade nova nascida depois do dilúvio, mostram Deus estabelecendo uma
aliança, e Jesus sendo levado ao deserto a fim de se preparar para sua missão.
2.1. A
Primeira Leitura
§ Tirada do livro do Gênesis mostrou Deus prometendo a
Noé, através de uma Aliança, simbolizada pelo arco-íris, que a terra e as
criaturas não seriam mais exterminadas.
§ Sabemos que esta
aliança será desdobrada em outras alianças: com Abraão (Gn 15, 1 s); Moisés (Ex
19,5; 24,3-8); e também na
Instituição do Sacerdócio do AT (Ex
19,21).
§ Tais alianças, porém, foram provisórias, pois nunca
devidamente cumpridas pelo povo. Contudo, todas restauradas pela Nova e Eterna
Aliança, estabelecida pelo sangue de Jesus Cristo derramado na cruz – Ele o Cordeiro
de Deus que veio redimir o homem.
2.2. O
Evangelho
§ Foi justamente o que ouvimos no evangelho tirado de
São Marcos. Jesus levado ao deserto pelo Espírito, a fim de se preparar para
sua missão salvadora.
§ São Marcos, ao contrário de São Mateus e São
Lucas, não apresenta as três tentações
de Jesus: apenas menciona que Ele ficou 40 dias no deserto e lá foi tentado por
Satanás.
§ Sim, Satanás que já havia levado o homem afastar-se de Deus e do paraíso (Gn 2,7-9; 3,1-7), aparece novamente
utilizando-se da palavra de Deus para tentar Seu Filho Jesus Cristo – queria mais
uma vez tirar o novo paraíso que Jesus devolveria ao homem no final de sua vida
pública. Por isso que o tentador aparece justamente no início da vida pública,
para, quem sabe, interromper o início de sua missão redentora.
§ Interessante que, ao contrário do homem no paraíso,
Jesus não se deixou seduzir pelo tentador. Ele não rompeu o diálogo com Deus, como o homem no paraíso, mas deixou-se guiar
por Sua palavra: o homem não vive só
de pão, mas de toda palavra que sai da boca de Deus.
3. Reflexão / Mensagem
§ Prezados irmãos, a Santa Igreja, nossa Mãe,
convida-nos hoje a viver a espiritualidade da Santa Quaresma: quem sabe
precisamos renovar a Aliança de Deus conosco, precisamos enfrentar com Jesus as
tentações e o mal que nunca faltam no deserto do nosso tempo. Fiquemos com a
seguinte reflexão como mensagem para estes dias.
3.1. O Deserto do nosso tempo
§
Muito curioso Jesus tentado no coração do
deserto, vivendo entre os animais selvagens, mas servido pelos anjos –
que delicada contradição: Jesus entre feras e anjos!
§
O deserto na História Bíblica foi o lugar de
uma dupla comunicação: 1) lugar da aridez, da solidão, da fome, do abandono,
onde não se planta e não se colhe, de dia muito quente, de noite muito frio,
sobra desespero, falta esperança; 2) escola de purificação e lugar da revelação
de Deus.
§ Interessante
que Moisés quando foi ter com o Faraó pedindo que deixasse o povo sair do
Egito, assim justificou o pedido: Assim falou o Senhor: deixa
o meu povo partir para que me faça uma festa no deserto (Ex 5,1). Imaginemos uma festa no deserto, onde tudo falta,
e festa celebrada por um povo cativo, sem nada nem motivo para celebrar!
§
Quantas pessoas ou povos vivem hoje assim no
deserto do nosso tempo: sem alegria e esperança, sem razões para celebrar coisa
alguma! Como o sofrimento acompanha o homem do nosso tempo! Tempo de violência,
indiferença, miséria, falsas alegrias, solidão, traumas, estresse, depressão,
carências emocionais, fragmentação familiar.
§ Entretanto, o deserto apareceu para o povo bíblico
como escola de purificação e lugar da revelação de Deus! Foi no deserto que o povo fez a experiência da maior proximidade
de Deus. O povo reconheceu no tempo em que esteve no deserto um tempo em que
recebeu grande afeição de Deus: foi por Ele tomado em seus braços, atraído por
Seu amor para falar-lhe ao coração (Os
11; 2,16). O deserto foi assim um novo tempo de noivado, tempo com promessas de
vida nova.
§
Você que está aqui hoje: nesta Quaresma, no deserto da sua vida e do
tempo presente, não tenha medo das feras
que sempre estão a rondar. Na escuridão ou nas sombras do nosso caminhar haverá
sempre um arco-íris enviado por Deus na pessoa de Seus anjos – anjos que nem
sempre nos damos conta, mas que nos guardam e estão tão presentes nas idas e
vindas de cada dia, assistindo nossa vocação/missão recebida.
3.2. A Campanha da Fraternidade
§ A CF deste ano, cujo tema é Fraternidade e Saúde Pública, e o lema, Que a saúde se difunda sobre a terra (cf. Eclo 38,8), é um oportuno convite a termos nesta
Quaresma um olhar cuidadoso para os enfermos – não apenas pelos doentes do
corpo, mas também os que têm necessidades espirituais e morais.
§ Vale lembrar o convite ao cuidado e ao olhar que
nos fez o Papa Bento XVI na sua mensagem para a Quaresma deste ano. Convidou
cada pessoa primeiramente a fixar o olhar
em Jesus, estar atenta aos outros, não se mostrar indiferente ao destino dos
irmãos, dar-se conta da realidade ao nosso redor – um bom programa
quaresmal!
Conclusão
§ Concluamos com São João Crisóstomo – trecho de uma
bela homilia, onde apresenta as cinco vias da penitência: 1ª, é a reprovação dos próprios
pecados; 2ª), o perdão das ofensas que nos fez o próximo; 3ª) a oração; 4ª), a
esmola; 5ª), a humildade (Homilia de diabolo tentatore 2,6: PG
49,263-264).
§ Fiquemos ainda com o
convite: Convertei-vos e crede no
Evangelho. O evangelho apresenta-nos Jesus: fixemos n’Ele o olhar para
termos
caminho seguro, verdade infalível, vida sem fim (A Imitação de Cristo,
livro III, c.56).
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